Patricia Sant’Anna, Helder Oliveira,
Vivian Berto, Victor Barboza, Dimitria Freitas
É uma quarta-feira comum e você resolve ir a um café para tomar o primeiro espresso do dia. É só isso o que você quer: um cafezinho e nada mais. Ao chegar no caixa e fazer seu pedido, no entanto, pode ser que você seja interpelada(o) para fazer uma escolha: entre tipos de café, por exemplo. Ou a origem: este grão queniano ou aquele da Colômbia? Ou a torra, qual tipo de leite, espuma ou chocolate acompanha. Às vezes o difícil mesmo pode ser escolher um café preto!
Brincadeiras e exageros à parte, somos “obrigados”, enquanto consumidores, a fazer cada vez mais escolhas. E escolhas minuciosas. Uma miríade de produtos e serviços oferecem tantas opções que podemos dizer que, ao invés de ajudar, como seria o esperado (quem não gosta de escolher?) elas podem atrapalhar. E aí entra a pergunta: escolher é legal, mas... será que estamos dando aos clientes opções demais?
O mundo da customização
O mercado de consumo sofisticado sofreu mutações bruscas no século 20, e passou do consumo de massa para o consumo nichado. Do nicho, caminha-se cada vez mais para a customização e individualização do produtos, serviços e experiências.
A customização extrema vem da mudança dos modelos de negócios indo para essa direção. Começando em alguns poucos negócios inovadores, principalmente com os que lidam com novas tecnologias, ela se espalhou a ponto de chegar a alguns negócios muito simples, como o cafezinho da esquina.
Escolha e infelicidade
Em meados dos anos 2000, o psicólogo americano Barry Schwartz fala, no livro O paradoxo da escolha, sobre o problema que poderia se tornar ter uma sociedade com escolhas demais. Ele se tornou bastante conhecido após apresentar um TED Talk onde apresenta este paradoxo.
Para Schwartz, a sociedade industrial construiu um “dogma”, que é: se quisermos maximizar a felicidade das pessoas, o caminho é maximizar as liberdades individuais. Este dogma é baseado na ideia de que a liberdade é inerentemente boa (poderíamos afirmar que é, sim, inerentemente boa, mas o que é liberdade é que entra em discussão).
A sociedade do hiperconsumo nos entrega o seguinte problema: podemos acordar todos os dias e escolher quem queremos ser. São muitas possibilidades abertas. Para Schwartz, a escolha extrema leva não à ação, mas à paralisia. Tememos fazer a escolha incorreta e nos arrepender depois. E, mesmo quando escolhemos, a tendência é ficarmos pensando depois como seria se tivéssemos escolhido diferente. Ou seja, ficamos menos satisfeitos com as escolhas que fazemos. Nos tornamos extremamente responsáveis por cada desígnio tomado, o que tende a nos trazer um sentimento de frustração provocado em nós, por nós mesmos.
A escolha extrema leva não à ação, mas à paralisia. Tememos fazer a escolha incorreta e nos arrepender depois.
Isso aflige especialmente gerações Y e Z, que nasceram e/ou cresceram com um mundo de escolhas à sua frente. E não só escolhas de consumo, mas também escolhas profissionais. Quem pode sonhar com uma carreira regular, crescente, previsível nos dias de hoje? Com profissões que aparecem e outras que se extinguem em questão de poucos anos? As possibilidades são inúmeras e a ansiedade, cada vez maior.
No texto Como os millenials se tornaram a geração do esgotamento, do Buzzfeed News, a exausta Anne Helen Petersen discorre como escolher é difícil para a geração que chegou à idade adulta nos últimos 10-15 anos e não faz ideia do que fazer com a vida. O mercado de trabalho incerto se entranha no cotidiano das pessoas em um nível tão alarmante (segundo a mesma autora, é uma geração que se convenceu de que tem que trabalhar o tempo inteiro) que fica difícil até fazer escolhas simples do dia a dia. Paralisia. Para Petersen, isso é a “fadiga da decisão”, quando ela não consegue decidir nem em qual médico ir, quando tem essa necessidade.
Quem diria que a prosperidade e opulência das sociedades contemporâneas poderiam trazer tristeza, ansiedade e depressão? Os gurus do “viver com menos” – a organizadora Marie Kondo, por exemplo – acertam em um ponto crucial para os indivíduos do hiperconsumo, e talvez por isso fazem tanto sucesso. Estamos fatigados e queremos menos, desejamos coisas mais simples, ansiamos por escolher pouco – o pensamento constante é: por favor, não me ofereça mais, ok?
Há produtos que já pensam o excesso de escolhas
Cases de empresas no mercado ganham pontos limitando as escolhas de seus clientes. É o exemplo do bem-sucedido e-commerce O Amor é Simples, possivelmente ainda um dos únicos no Brasil a apostar no modelo vestidos de casamento... simples.
A ideia das quatro amigas empreendedoras veio a partir da experiência de uma delas: às vésperas de seu casamento, não conseguiu achar na internet um modelo simples, confortável, barato e sem muitos detalhes. O investimento inicial no site e nos primeiros modelos foi bem baixo – R$12 mil reais. Resultado: vestidos realmente simples e pouquíssimas opções. O site não mudou muito desde sua criação em 2014 e hoje, o que o deixa com aquela eterna cara de MVP (Minimal Value Product). Mas, para a noiva prática, precisa de mais?
O modelo de vestido pode ser customizado, mas com restrições: no máximo um aumento da cauda, por exemplo. A descrição dos modelos ainda dá dicas como que tipo de sutiã usar com o modelo. Considerando o “peso” das escolhas que um casamento implica (local, convidados, buffet... quem já casou pode nomear!), é praticamente um sonho não ter problemas com a escolha do vestido!
O mercado de tecnologia e gadgets também está de olho na limitação de escolhas. O caminho dessa oportunidade para smatphones é óbvio (bem mais óbvio que os vestidos de noiva), já que temos uma noção que a escolha que fazemos do chamado “tempo de tela” é mais um hábito vicioso que escolhas efetivamente produtivas. Os smartphones “minimalistas” têm visual tão ou mais arrojado que os comuns, mas limitam muitas das suas tarefas, tornando-os quase similares aos celulares de antigamente – ligações, mensagens, despertador, e talvez, acesso à internet – como o Light Phone e o John’s Phone, não disponíveis no mercado brasileiro.
Alguns segmentos do mercado de alimentos já conhece o poder das poucas escolhas há um certo tempo. Quando vamos a pequenas hamburguerias e vemos três ou quatro opções de sanduíches, como fazer a escolha errada? Além disso, essa possibilidade torna a operação mais enxuta, e consequentemente mais barata e mais rápida.
Dependendo do segmento em que você atua, vale pensar: estou oferecendo opções demais para os meus clientes? Posso causar ansiedade e paralisia (e, como consequência, afastamento)? Tão paradoxal quanto possa parecer, o excesso de escolhas traz, sim, infelicidade. Pense se você não precisa rever o seu negócio para ajudar seu cliente a escolher menos.
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